domingo, fevereiro 28, 2010

JOSÉ MINDLIN, 95 ANOS DE VIDA ENTRE LIVROS
(8/9/1914 - 28/2/2010)



Tantas vezes eu o visitei, tantas vezes eu levei amigos que queriam conhecê-lo de perto à sua casa, tantas vezes eu consultei sua biblioteca, para dizer o mínimo, ímpar, tantas vezes ele me presenteou com livros e revistas que guardo com um carinho profundo.
Uma vez ele quis conhecer a minha humilde biblioteca. Pediu que a Cristina, sua bibliotecária-mor, me telefonasse marcando. Eu fiquei besta de feliz. No dia marcado ele chegou, me lembro como se fora hoje, cumprimentou-me e perguntou de supetão, você tem Há uma gota de sangue em cada poema, do Mário Sobral? (pseudônimo que Mário de Andrade utilizou em seu primeiro livro). Eu fiquei triste, porque minha resposta foi não. Mas hoje eu diria, sim, pois consegui o livro alguns anos depois. Mas talvez o meu sim de hoje o deixasse menos feliz porque, nós, colecionadores, temos que ter sempre algo que o outro não tem, para sempre estufarmos o peito e dizer de boca bem cheia: eu tenho este e você não tem, feito crianças.
Eu gostava imensamente dele, o admirava demais da conta por tudo o que ele fez pelo nosso país, foi um homem empreendedor, um visionário mesmo. Lutou contra a ditadura, editou e reeditou livros e periódicos raros e de grande importância para a cultura nacional, ajudou a divulgar a música e a pintura em nosso país, presidou muitas entidades, escreveu livros, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, etc. Mas de todo seu legado, para mim, o mais importante foi a magnífica biblioteca que formou ao longo de oitenta e dois anos (ele dizia que começara a biblioteca aos 13 anos). E parte dela, a Brasiliana, doada por ele e sua mulher, Guita, estará brevemente aberta ao público, num prédio estupendo, na Universidade de São Paulo...
Eu queria falar muito mais sobre ele, mas hoje eu não posso, as palavras me faltam, ele levou as palavras com ele... Então, sem palavras, eu me transporto para a sua biblioteca e faço silêncio bem embaixo da grande jabuticabeira que ele tinha bem defronte dela, local onde tantas vezes paramos para apreciar aquela tão bela árvore e, em pensamento, lhe digo: (Dr. Mindlin, não se preocupe, pessoas não morrem, elas só ficam encantadas...).